sábado, 25 de junho de 2011

Parecer Coren-SC nº 019/2004


 
PARECER COREN-SC Nº019/AT/2004


                                                                                             Assunto: Realização de procedimentos de Enfermagem pelos diferentes níveis profissionais.
1.      Das consultas
Duas solicitações de esclarecimento foram encaminhadas ao COREN-SC acerca da realização de procedimentos de Enfermagem pelos diferentes níveis profissionais que integram a categoria. A primeira procedente da Gerência de Enfermagem do Hospital (...) que formula as seguintes perguntas: a quem compete (Enfermeiro, ou Técnico em Enfermagem) realizar o cateterismo vesical?; Somente o Enfermeiro está habilitado para fazer a punção arterial? A segunda solicitação, encaminhada pela Coordenação Regional da Área de Saúde (...), refere-se ao ensino de procedimentos para os alunos do Curso Técnico de Enfermagem, nas modalidades Qualificação profissional técnica – Auxiliar de Enfermagem e Habilitação em Técnico em Enfermagem. Solicita parecer sobre quais procedimentos são restritos a estes profissionais (Auxiliar e Técnico). Menciona, como exemplo, apenas o cateterismo vesical.
           
2.      Da fundamentação e análise
As normas que regulamentam o exercício profissional da Enfermagem, entre elas a Lei nº 7.498/86 e Decreto nº 94.406/87, apresentam as competências por nível de formação e, portanto, por nível de complexidade. Desta forma, todas as atividades de Enfermagem podem ser realizadas pelos Enfermeiros. O Técnico em Enfermagem pode executar os procedimentos específicos atribuídos pela legislação ao seu nível de formação e todos previstos para o Auxiliar de Enfermagem, exceto os privativos do Enfermeiro. O Auxiliar de Enfermagem pode realizar somente os procedimentos previstos na legislação, de forma que não lhe compete atividades específicas atribuídas ao Técnico e as privativas do Enfermeiro.

Salientamos que a legislação do exercício profissional não alcança, e nem poderia, a totalidade das atividades/procedimentos de Enfermagem, ou seja, exemplifica-os, de modo que o COFEN tem estabelecido normas complementares, através de resoluções, para situações como, por exemplo: Atuação dos Profissionais de Enfermagem em Hemoterapia e Transplante de Medula (Res. nº 200/97); Atuação dos Profissionais de Enfermagem que trabalham com Quimioterápicos Antineoplásicos (Res. nº 210/98); Atuação dos profissionais de Enfermagem que trabalham com Radiação Ionizante (Res. nº 211/98); Atuação do Enfermeiro na captação e transplante de órgãos e tecidos (Res. nº 292/2004).

Os níveis de complexidade dos procedimentos/cuidados, segundo a formação dos profissionais, estão estabelecidos como segue:
Ø       Auxiliares de Enfermagem: cuidados de rotina, de simples execução e de natureza repetitiva.
Ø       Técnicos em Enfermagem: cuidados diretos a pacientes graves.
Ø       Enfermeiros: cuidados diretos a pacientes graves com risco de vida e cuidados de maior complexidade técnica.

Entendemos que a legislação, ao apresentar uma hierarquização das competências por nível de complexidade, tem a intenção de proteger o usuário, garantindo-lhe cuidados de Enfermagem executados por profissional, segundo o seu nível de formação, conquistadas durante o seu processo de aprendizagem escolar, não se preocupando com as competências conquistadas durante a prática profissional.

      O que se entende por cuidados de maior complexidade técnica? Cuidados a pacientes graves? Pacientes com risco de vida? A Enfermagem precisa compreender, antes de tudo, que o seu exercício não se restringe à realização de técnicas. Um conjunto de elementos compõe o cuidado, que exige dos profissionais, reflexão, análise e avaliação da situação de cada cliente, bem como a crítica e avaliação de sua própria competência para a realização dos cuidados.  (Competência, entendida aqui como a capacidade de mobilizar, articular e colocar em ação os conhecimentos, as habilidades e as atitudes requeridos para o exercício da profissão). Não se trata então de arrolar técnicas que podem, ou não, ser executadas por este ou aquele profissional, tal como se fosse uma rotina, que se cumpre, porque alguém assim a determinou e que não exige reflexão/análise/avaliação/decisão.

Sob o ponto de vista da legislação do exercício profissional todos os cuidados de Enfermagem, requeridos por paciente grave com risco de vida, devem ser executados pelo Enfermeiro, pois que a norma legal define como privativo deste profissional os cuidados diretos de Enfermagem a pacientes graves com risco de vida. Assim, nesta situação, não podem ser delegados aos Técnicos e Auxiliares de Enfermagem quaisquer procedimentos. Da mesma forma, Auxiliares de Enfermagem não podem prestar cuidados a pacientes em estado grave, ou seja, somente Enfermeiros e Técnicos de Enfermagem devem cuidar destes clientes.

Por outro lado, os Técnicos e Auxiliares de Enfermagem, somente poderão exercer a profissão sob orientação, direção e supervisão dos Enfermeiros (Lei nº 7.498/86, art.15; Decreto nº 94.406/87, art.13). Para atender esta norma, os Enfermeiros precisam conhecer o significado dos termos, principalmente supervisão que não pode ser confundida com presença física em cada procedimento.

A polêmica em torno de quem faz o que é tão antiga quanto à legislação do exercício profissional, não se percebendo mudança significativa na conduta do Enfermeiro frente a situações que precisam de reflexão/análise/avaliação e decisão para delegar ou não os procedimentos requeridos pelo cliente. Encontramos no Relatório do COREN-SC nº004/UF/95, argumentos que reforçam o que entendemos sobre o tema e que acreditamos ser correto.

Os cuidados de maior complexidade técnica caracterizam-se pela sua qualidade ou caráter complexo. Segundo o dicionário de Ferreira, é complexo o que: abrange ou encerra muitos elementos ou partes; pode ser observado sob diferentes aspectos; apresenta-se confuso, complicado; representa um grupo ou conjunto de coisas, fatos ou circunstâncias que tem qualquer ligação ou nexo entre si, ou seja, representa um conjunto de atos interligados. O que é complexo pode ser confuso, ou seja, desordenado; misturado; tumultuado; intrincado. Pode, também, ser complicado, ou seja; embaraçado; difícil de perceber ou difícil de resolver, por reunir aspectos ou coisas heterogêneas.

A heterogeneidade de elementos ou aspectos, difíceis de serem percebidos ou de serem resolvidos, caracteriza uma situação complexa. A execução de cuidados de maior complexidade técnica, nesta situação, requer, assim, preparo correspondente, apontado na legislação como sendo aquele que dá aos profissionais conhecimentos de base científica e capacidade de tomar decisões imediatas. Envolve, portanto, habilidade e capacidade de observação, de interpretação, de ligação ou dissociação de elementos, de avaliação contínua e de tomada de decisão. Assim, cuidados de maior complexidade técnica são todas as atividades, componentes de uma situação que exige do profissional Enfermeiro a habilidade de observação, identificação e interpretação de dados, o estabelecimento de relações entre os dados; o planejamento e a execução da intervenção, acompanhada de avaliação contínua (Relatório COREN-SC nº004/UF/95).
Grave, segundo o dicionário de Ferreira, tem significado de: importante, sério, ponderoso, austero, circunspecto, severo, dolorosa, penoso; suscetível de conseqüências sérias, trágicas. Para o autor, risco indica perigo ou possibilidade de perigo; possibilidade de perda ou de responsabilidade pelo dano; proximidade da morte. A gravidade e o risco de vida de uma pessoa são determinados por um conjunto de elementos e não por um elemento isoladamente. Os fatores “gravidade” e “risco de vida” representam sempre situações ou circunstâncias complexas. O profissional, embasado cientificamente, no caso, o Enfermeiro, deverá ter a habilidade de identificar a situação de gravidade e de risco de vida e de estabelecer diferença entre ambos. Para Gomes (1.988, p. 12), pacientes graves são aqueles que apresentam um comprometimento importante de suas funções vitais. Estão em risco de vida aqueles que, embora se encontrem bem no momento, podem apresentar, subitamente, alterações de suas funções vitais. Prestar cuidados a pacientes graves e a pacientes graves com risco de vida exige do profissional, além de conhecimentos científico-técnicos específicos, a capacidade de observação e vigilância para que, precocemente, sejam identificados novos sinais e/ou sintomas (Relatório COREN-SC nº004/UF/95).
A partir das considerações anteriores, a realização dos procedimentos de Enfermagem deve ser sempre precedida de avaliação do estado de saúde do cliente pelo Enfermeiro e, somente então, este profissional deverá decidir se o procedimento será realizado por ele mesmo ou se o delegará a outro profissional da equipe devidamente preparado para tal.
Por decisão/opção de muitas instituições de saúde, ou de áreas específicas destas instituições, o cateterismo vesical é atribuição privativa do Enfermeiro não sendo, portanto, delegada a outro membro da equipe. O COFEN, ao estabelecer os valores mínimos da tabela de honorários de serviços de Enfermagem (Res. nº 264/2001), indica o cateterismo vesical  como um dos procedimentos que pode ser realizado pelo Enfermeiro, Técnico e Auxiliar de Enfermagem. Esta possibilidade não invalida o que afirmamos anteriormente sobre a avaliação do estado do cliente a ser submetido ao procedimento, pois se trata de uma premissa para qualquer procedimento, considerando a gravidade, o risco de vida e complexidade da atividade.
No que se refere ao ensino da técnica aos alunos da qualificação profissional técnica – Auxiliares de Enfermagem e da habilitação – Técnico em Enfermagem, asseguramos que o procedimento pode e deve ser ensinado, mas também compete aos docentes esclarecer que o procedimento deverá ser realizado por delegação do Enfermeiro, com base na avaliação da situação do cliente e da competência do Técnico ou Auxiliar de Enfermagem que irá executar o procedimento.
Embora o requerente da área do ensino solicita parecer sobre quais procedimentos são da competência dos Auxiliares e Técnicos em Enfermagem, limitaremo-nos, neste parecer, ao cateterismo vesical, isto porque: a) não nos foi esclarecido a respeito de quais, entre os muitos procedimentos de Enfermagem, os docentes tem dúvidas; b) os docentes devem planejar o ensino tendo como base a legislação do exercício profissional, as Resoluções do COFEN e o presente parecer; c) o COREN-SC constituirá, para breve, uma comissão para atualizar a decisão COREN-SC nº020/2002 que trata dos valores da tabela de honorários e procedimentos de Enfermagem.
Compete-nos ainda opinar sobre a punção arterial, solicitação procedente da Gerência de Enfermagem. A punção arterial é um procedimento de maior complexidade técnica e requer conhecimentos e habilidades específicas e ainda a capacidade de tomar decisões imediatas. Assim, no âmbito da Enfermagem, este procedimento somente poderá ser realizado por Enfermeiro.       

3.      Da conclusão

Considerando o exposto, concluímos que:
a)      O Enfermeiro deve prestar os cuidados diretos de Enfermagem a pacientes graves com risco de vida e realizar os cuidados de maior complexidade que exigem conhecimentos científicos específicos e a capacidade de tomar decisões imediatas.
b)      Os cuidados de Enfermagem requeridos por pacientes graves devem ser executados por Enfermeiros e Técnicos em Enfermagem.
c)       A avaliação da gravidade do cliente, do risco de vida e da complexidade técnica dos procedimentos de Enfermagem, pelo Enfermeiro, precede à delegação dos cuidados aos Técnicos e Auxiliares de Enfermagem.
d)      O Enfermeiro somente poderá delegar cuidados de Enfermagem a Técnicos e Auxiliares de Enfermagem com competência para a sua execução.
e)      A técnica de cateterismo vesical pode e deve ser ensinada aos alunos do Curso Técnico de Enfermagem nos níveis de qualificação e habilitação -, com a ressalva de que o procedimento deverá ser realizado por delegação e supervisão do Enfermeiro, considerada a competência de cada profissional.
f)        Caso permaneçam dúvidas acerca de procedimentos a serem ensinados nos Cursos Técnicos de Enfermagem, a Coordenação de Enfermagem deverá listá-los e solicitar novos esclarecimentos.
g)      O cateterismo vesical pode ser realizado, nas instituições de saúde, por Técnicos e Auxiliares de Enfermagem, mediante a avaliação do estado de saúde do cliente (não se trata, portanto de uma atividade isolada) e da competência do profissional a quem será delegada a atividade.
h)      Deve ser respeitada a decisão dos Serviços de Enfermagem que tem o cateterismo vesical como uma atividade privativa do Enfermeiro.
i)        A punção arterial, por se tratar de atividade complexa e que requer a capacidade de tomada de decisão imediata, no âmbito da Enfermagem, somente poderá ser realizada por Enfermeiro.


É o parecer.

Bibliografia

Decreto nº 94.406, de 08 de junho de 1987. Regulamenta a Lei n º7.498, de 25 de junho de 1986, que regulamenta o exercício profissional da Enfermagem.
Lei nº 7.498, de 25 de junho de 1986. Dispõe sobre a regulamentação do exercício da Enfermagem.
Relatório COREN-SC nº 004/AT/95. Conceituação de termos integrantes da legislação que regulamenta o exercício profissional da categoria.
Resolução COFEN nº 264/2000. Atualiza os valores da tabela mínima de honorários de serviços prestados pela Enfermagem.

Florianópolis, 23 de julho de 2004.

Lidvina Horr
COREN-SC 1.505
Assessora Técnica

Parecer aprovado pela Plenária do COREN-SC, em sua 400ª Reunião Ordinária, realizada em 19/08/2004.

Disponível em: http://docs.google.com/viewer?a=v&q=cache:s9_wHlrvxTYJ:www.coren-sc.org.br/documentacao2/P019-2004.doc+cateterismo+vesical+a+quem+compete+realizar&hl=pt-BR&gl=br&pid=bl&srcid=ADGEESjV_wu0xf63xUXAa2tFI6fm_BmxkRW0brPJ3Ph05KRIyjpjHJMfGjp1yxTbxdM1SrAFfMzCOOUKYpzrxR1E9v1SsjBQUobXW9M2uHbzywjv0igTF14O6bSOsBW1VAddH44-OkgA&sig=AHIEtbTbH4ZwPLBwG_NYBuywpXCoXbRtgQ


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